Você sabia que deixar candidatos(as) ingressar no ambiente de trabalho pode vir a configurar assédio eleitoral?
Nesse ano somos convidados(as) a participar das eleições municipais, para votar em candidatos(as) a vereador(a) e à prefeito(a). A democracia estará em festas, ocasião em que exerceremos o voto, depositando naqueles que melhores propostas apresentarem diante de nossa convicção política. Convicção essa que devemos construir por nós mesmos, lendo as propostas do partido ao qual os(as) candidatos(as) estão vinculados(as) e às propostas que eles(as) – candidatos(as) – divulgam e assumem que vão implementá-las. E, com isso, decidirmos em qual(is) candidato/a(s) votar.
As estatísticas demonstraram que nas eleições de 2022, o Ministério Público do Trabalho enfrentou um aumento desproporcional de condutas de discriminação e violência praticada dentro dos locais de trabalho em todo o país, denominando-se assédio eleitoral. O MPT recebeu, nesse período, 3.145 (três mil cento e quarenta e cinco) denúncias.
O assédio eleitoral, de acordo com a Resolução nº 335 do Conselho Superior da Justiça do Trabalho (Brasil) (CSJT), caracteriza-se pela prática de coação, intimidação, ameaça, humilhação ou constrangimento associados ao cenário eleitoral, com o objetivo de influenciar, manipular ou forçar voto, apoio, orientação ou manifestação política de trabalhadores(as) no local de trabalho ou em situações relacionadas ao trabalho.
Também considera assédio eleitoral quando ocorre distinção, exclusão ou preferência por um(a) trabalhador(a) em razão da sua convicção ou opinião política, inclusive no processo de admissão.
Essa forma de assédio se inicia durante as pré-candidaturas e pode se estender mesmo após a posse dos vencedores. Para o MPT, um único ato é suficiente para configuração de assédio eleitoral.
O assédio eleitoral pode ser praticado pelo empregador, representante ou preposto da empresa; entre colegas de trabalho – não sendo necessária a existência de hierarquia entre o assediador e a vítima –; pelos(as) trabalhadores(as) em relação aos seus superiores hierárquicos e por terceiros, como tomadores de serviço e clientes.
Pode acontecer no local de trabalho ou durante a prestação de serviços, como nos períodos de descanso, nos alojamentos ou refeitórios, nas reuniões festivas, nos deslocamentos, desde que seja em razão do trabalho. Também pode ocorrer de forma virtual, como nas redes sociais, e-mails ou grupos corporativos ou criados por pessoas relacionadas ao trabalho.
Condutas que podem caracterizar assédio eleitoral:
• Prometer benefício ou ameaçar de prejuízo no contrato de trabalho em razão do resultado das eleições ser favorável ou contrário a candidato(a) defendido(a) pelo assediador(a);
• Proferir comentários depreciativos ou realizar atos que causem humilhação ou discriminação de trabalhadores que apoiam candidato(a) diferente do(a) defendido(a) pelo(a) assediador(a);
• Entregar material de propaganda eleitoral aos trabalhadores e trabalhadoras ou expor propaganda eleitoral nos locais de trabalho ou descanso;
• Impor/obrigar o uso de uniforme, vestimentas, bonés, botons alusivos à determinada campanha eleitoral ou candidato(a);
• Ameaçar trabalhadores(as) de serem dispensados caso determinado(a) candidato(a) ganhe ou perca as eleições;
• Ameaçar o fechamento da empresa caso determinado(a) candidato(a) ganhe ou perca as eleições;
• Ameaçar cortes de pessoal ou mudança na forma de trabalho caso o(a) candidato(a) oponente ao(à) indicado(a) ganhe as eleições;
• Prometer a concessão de qualquer benefício ou vantagem vinculada ao voto, à orientação política e à manifestação eleitoral;
• Realizar reuniões com trabalhadores(as), no local de trabalho ou em razão do trabalho, para tratar de orientação política no pleito eleitoral;
• Difundir reuniões e discursos na internet e mídias sociais (Instagram, Facebook, Threads, Tiktok etc.) que incitem a violência e a discriminação de trabalhadores(as) com orientação política contrária;
• Não liberar os(as) trabalhadores(as) para que, no dia da eleição, exerçam seu direito de voto ou exigir que haja compensação do tempo despendido pelo trabalhador para votar;
• Designar escala e local de trabalho no dia da eleição que favoreça o voto apenas de trabalhadores e trabalhadoras que afirmam apoiar o(a) candidato(a) indicado(a) ou que crie embaraços para a participação daqueles que apoiam o(a) candidato(a) oponente;
• Exigir que os(as) trabalhadores(as) indiquem a seção eleitoral em que irão realizar a votação ou ainda obrigar que seja filmado ou fotografado, pelo(a) próprio(a) trabalhador(a), o momento do seu voto;
• Reter o documento de trabalhadores(as) para que não possam votar no dia da eleição;
• Realizar enquetes ou pesquisa relacionadas ao processo eleitoral com a participação das pessoas trabalhadoras, ainda que não haja identificação dos votantes;
• Coagir trabalhadores(as) a participar de eventos promovidos pelo o(a) candidato(a) defendido(a) pelo(a) assediador(a), a exemplo de comícios e palestras, durante o horário de trabalho ou fora do expediente;
O Direito brasileiro veda que o empregador imponha aos seus empregados ou utilize o local de trabalho para propagar ideias político-partidárias. Assim, é proibido ao empregador realizar propaganda eleitoral no ambiente de trabalho, razão pela qual não se aplica a ideia de que a propriedade privada possui livre acesso de pessoas, de modo que é vedada a realização de qualquer propaganda política dentro das empresas, inclusive, receber candidatos(as) para expor suas ideologias e promessas.
Ademais, no ambiente de trabalho, não pode haver a distribuição de nenhum material de propaganda eleitoral de qualquer natureza.
A Justiça do Trabalho lançou a campanha de combate ao assédio eleitoral no trabalho com o slogan “seu voto, sua voz”, com o objetivo de conscientizar trabalhadores(as) e empregadores sobre os limites eleitorais no ambiente de trabalho. Referida campanha será promovida por todos os tribunais do trabalho do país, em parceria com a Justiça Eleitoral e os Ministérios Públicos do Trabalho e Eleitoral.
Caso seja constatada a ocorrência de assédio eleitoral dentro do ambiente de trabalho, pode ser impostas as sanções: recomendação para que se retrate no prazo de 24 horas, além de abstenção de prática ilícita; termo de ajuste de conduta com imposição de obrigações de fazer e não fazer, sob pena de pagamento de multa e dano moral coletivo e/ou individual; e ajuizamento de ação civil pública pelo MPT.
Além das sanções acima, o empregador poderá sofrer outras consequências: pagamento de multa de 10 vezes o valor do maior salário pago pelo empregador, elevado em 50% em caso de reincidência, proibição de empréstimos ou financiamento junto a instituições financeiras.
Por fim, o empregador também poderá sofrer sanções individuais como reparação por dano moral individual, reintegração com ressarcimento integral de todo o período de afastamento, mediante pagamento das remunerações devidas, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros legais, bem como percepção, em dobro, da remuneração do período de afastamento, corrigida monetariamente e acrescida de juros legais.
Diante do cenário, recomenda-se aos empregadores que mantenham a neutralidade no ambiente de trabalho, proibindo qualquer forma de pressão ou coerção sobre os empregados(as) em relação às suas escolhas eleitorais, além de conscientizar seus líderes e gestores sobre o tema e não permitir ou fomentar fóruns de discussão político-partidária, a fim de evitar a prática do assédio.
Às empresas é importante apoiarem a campanha “seu voto, sua voz – assédio eleitoral no trabalho é crime”, além de promoverem a liberdade de expressão de seus empregados, criar canais de denúncia para que os empregados reportem incidentes relacionados ao assédio eleitoral e aplicar sanções aos infratores, visando garantir um ambiente de trabalho saudável e respeito, especialmente, durante o período eleitoral.
Para enfrentar esses desafios, é fundamental estabelecer o Compliance dentro da empresa para que sejam implantadas políticas claras que definam o que é permitido, esperado e proibido em relação aos comportamentos dos(as) seus(suas) empregados(as), bem como realizar treinamentos e palestras regulares referente ao tema assédio e estabelecer regras e punições cabíveis aos(às) infratores(as).
Todas essas políticas devem respeitar a liberdade individual do(a) empregado(a), equilibrando-a com os riscos corporativos advindos do processo eleitoral.
Laura Cristovam Machado
OAB-SP nº 488.214